terça-feira, 15 de julho de 2008

Fazendo bom proveito do Direito

A menina se depara com o problema da “estagnação social”, apresentado pelos interessados no assunto, como resultado lógico da equação Justiça = Direito. Afirmativa cruel, imediata no incômodo e tristeza de quem não entende como legítima tal equação. Não, a Justiça não pode se reduzir ao Direito e nem quer estar centrada nele. Do contrário, este quer lhe servir como instrumento eficaz – não o único – à sua atuação.

Precisamos identificar as bases dessa cultura legalista, que ao se firmar, priva o acesso de maioria esmagadora da sociedade aos direitos que lhe são garantidos, ou os distancia deles.

Se reduzimos o Direito ao seu farto complexo de leis, reduzimos não só a sua aplicabilidade, mas também o contexto social ao qual se encontra inserido. Nesse sentido, fica fácil observar a fragilidade de todo e qualquer sistema jurídico, bem como sua ineficácia e inaplicabilidade, o que não é de todo negativo, pois permite buscar mecanismos para otimizar sua atuação. No entanto, esse seria apenas o primeiro passo.

Para chegar à etapa seguinte, é importante pensar o Direito não apenas enquanto conjunto de normas, mas como Ciência Jurídica que busca, antes de tudo, viabilizar, estabelecer ou firmar o bem-comum. De modo que não se trata da defesa pura e simples de uma ordem social para o Estado-Juiz, ou da primazia dos direitos de cada indivíduo, mas daquela ordem mínima que precisa ser mantida, justamente porque servirá de “pano de fundo” para o bem-comum.

Entenderemos então o papel do Direito no processo de socialização ao adquirimos clareza do que é este bem-comum e dos meios de alcançá-lo, quando evidenciarmos a necessidade de aliá-lo a outras ciências, seja para fundamentar, seja para viabilizar sua aplicação.

Aqui podemos pensar na importância da Psicologia Jurídica quando se busca manter a ordem quer a partir de decisões “particulares”, resultantes de uma separação judicial, por exemplo, quer na decisão de punir atos infracionais cometidos por adolescentes, que tenham resultado na morte de um indivíduo. Talvez, para o Direito em sua vertente legalista, um ato infracional com resultado morte, necessite apenas ser reparado com a “punição devida”, mas para o Direito humanizado, há ainda a preocupação em recuperar aquele menor, de lhe garantir condições dignas de sobrevivência, afim de que possa seguir a vida por caminhos que não sejam os da violência e da marginalidade.

Ironicamente, a menina acaba por concluir que o Direito não pode alcançar seu fim-social se está impedido de se aliar às demais categorias da vida humana, nos campos econômico, político, administrativo, social. Somente com a colaboração de outros segmentos, as normas poderão se adequar às necessidades do bem-comum que toda a sociedade almeja, deixando de lado as de certos grupos ou categorias privilegiadas por aqueles que a redigiram – estes, em tese não estão envolvidos diretamente à sua aplicação.

Depende do trabalho dos operadores do Direito? Sim, mas não exclusivamente deles. Depende muito mais dos cidadãos que o invocam, que sem dúvidas são a maioria.

Desta forma, o problema não é mais a Justiça reduzida ao Direito, ou o Direito reduzido à norma, mas “quem” os reduz. O problemas é a forma com a qual os cidadãos tratam o Direito, evocando o legalismo em proveito próprio, desvinculando-o daquelas que chamamos “ciências auxiliares” e, consequentemente, distanciando a norma do seu fim-social.

Se o Direito visa unicamente possibilitar o bem-comum através da manutenção da ordem em todos os seguimentos da vida humana – não se trata de estabelecer uma ordem, mas de manter a ordem que a própria sociedade legitimou – respondam: há fundamento para tamanho preconceito?

A melhor tática é fazer bom proveito das ferramentas oferecidas pelo Direito e com as demais possibilidades de atuação, seguir em frente na luta social pelo tão desejado bem-comum. Grande diferencial: estarem aliados.

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