terça-feira, 15 de julho de 2008

Coisas da vida

Chegou o dia em que o STF se posicionou sobre o uso de Células-Tronco Embrionárias em pesquisas científicas e foi favorável. Tantos se alegraram e tantos mais tiveram orgulho da decisão – tida como a mais acertada.

Mas para a menina restava tristeza e preocupações, pois precisara “engolir” seu lamento incompreendido. Sim, acreditem! A menina sentiu não só o peso da Lei sobre seus ombros, mas a dor do grito abandonado que ecoa nas ruas... Se por um lado era incompreendida, por outro sentia-se incapaz de compreender.

Ela entende que decisões como essas, capazes de influir definitivamente no curso das coisas, mais precisamente na forma com a qual a vida será tratada pela sociedade, exigem ponderação e prudência, mas não só. Trazem consigo efeitos irretroagíveis, sobretudo quando legitimadas por força de Lei. Mesmo que num futuro próximo se entenda que não se trata da decisão mais acertada, nada poderá ser feito em prol daqueles que restaram prejudicados. É justamente neste ponto que reside a gravidade da coisa, aí mora sua angústia.

Posicionamentos que dizem respeito não só ao futuro da sociedade, mas ao de minorias esquecidas, como os embriões e aqueles doentes cuja esperança está na evolução das pesquisas biotecnológicas, ou as populações ribeirinhas e os sertanejos do semi-árido nordestino, no caso da Transposição do Rio São Francisco, por exemplo, precisam ser norteados por princípios que vão além dos interesses político-econômicos ou biotecnológicos. Necessitam de um norte que vai muito além do que pode supor a Lei. Mesmo quando os mais otimistas antevêem seus benefícios, os resultados não se reduzem às previsões legais, as soluções não se escondem por de trás da adequação ou do cumprimento de uma norma.

A menina pensa a vida humana em seu início e em qualquer fase de desenvolvimento como inviolável, mas sabe que, no entanto, se trata de um argumento que muitos podem refutar, alegando a imprecisão desse início. Do mesmo modo, juridicamente, quando se fala “do nascimento com vida”, ou nos dizeres do Ministro: “vida pós-parto para ganho de personalidade perante o direito". Ela tem certeza de que aquele embrião é o início de uma pessoa, e que para tanto, necessita unicamente de tempo e condições para se desenvolver.

Dizem por aí que “a vida humana é altamente difícil de ser definida, a não ser por dogmas”, e talvez seja verdade... Ou a ciência está muito ocupada para definir quando é o início de uma vida, ou simplesmente não é capaz de fazê-lo. Para a menina, uma vida em desenvolvimento já é vida – uma questão de tempo e “colaboração” dos adultos. O problema é que as “feridas sociais” antepuseram outra preocupação: as condições ou possibilidades de vida, que agora servem como desculpa. Fomos vítimas de uma inversão de valores.

De fato, não podemos “tratar de embriões que estão se desenvolvendo em um útero do mesmo modo que embriões em vitro, incapazes de se desenvolver. Não é a mesma coisa”. Dessa forma, uma coisa é afirmar que o embrião é vida humana, outra é reduzi-lo ao status de material genético, por sua impossibilidade de se desenvolver. Será que não percebemos se tratar de dois assuntos distintos?

A inviolabilidade do direito a vida, mais do que garantias de nascimento e morte, sugerem à menina respeito (sagrado até) a tudo que envolve a vida humana e também ética para lidar com ela. A impossibilidade de vida daqueles embriões congelados é um ponto de extrema relevância, mas não é o único que deveria ser considerado.

A menina não sabe se uma sociedade incapaz de definir o início de uma vida humana, ao permitir que a mesma se torne material de pesquisa, saberá no futuro impor limites à sua manipulação.

Pode parecer simplório, mas ela teme a manipulação da vida, quando acabarem os embriões inviáveis e os viáveis venham a ser “produzidos” – (ou não seriam “sacrificados”, com o perdão da palavra) – para fins de pesquisa e a vida humana deixar de ser inviolável na sua gênese.

A menina não se conforma. Deseja o bem daqueles doentes que depositam sua esperança nas pesquisas biotecnológicas tanto quanto o dos embriões, dos idosos e de cada homem. Ela sonha com uma sociedade que não se enquadra em contra-valores fascistas, mas que dá o devido respeito aos doentes e aos saudáveis, aos que se desenvolvem e aos que alcançam ao fim de seus dias, reconhecendo a importância e beleza de cada um.

Acredita sobretudo no bem-comum, na fraternidade e deseja construir uma sociedade em que a vida encontre dignidade em todos os estágios e condições.... Ela crê de verdade que isso é possível. E, por mais que seja difícil dar forma a essa sociedade, é capaz de reconhecer aqueles elementos que não se encaixam nela...

Seguirá acreditando e fazendo a sua parte.

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