Sonhava em ser mulher quando crescesse...
Tinha ainda trejeitos e manias de menina (e muito orgulho disso também), conjugados à certeza de que não haveria de passar por mulherzinha jamais: era seu compromisso consigo mesma.
Desejava jogar no time das que olham nos olhos, haja o que houver, e que não o fazem para impor sua presença, afirmar sua feminilidade ou desafiar quem quer que seja, mas para serem justas consigo mesmas. Das que não dissociam a luta da justiça e que sabem perfeitamente que seus direitos não estão acima dos demais, e justamente por isso são muito mais guerreiras. Guerreiras de tantas lutas, ora silenciosas, ora ensurdecedoras, enlouquecedoras até.
Elas, tão donas de si e ao mesmo tempo tão dos outros. Que sabem olhar com amor e com autoridade, que esbanjam ousadia e espírito de serviço, garra e docilidade, determinação e prudência...
Dentro de si, mal podia conter o orgulho.
Quanto mais observava, mais brechas dava ao medo.
Sim, não foi difícil descobrir que não seria fácil. Evidenciava as dificuldades sociais, grandes e tão cruéis, e a luta que fora imposta para vencê-las...
Lá no fundinho se sentia aliviada, pois tinha a intuição que sua luta seria outra: não uma luta forjada por modernos ideais, por uma falsa justiça, por uma tola disputa de lugares ou pela inútil tentativa de medir forças. Não. Mais que isso. Sua luta seria a busca por justiça, por equidade, sem mitigar sua própria imagem, sem distorcer seu próprio papel, sem abrir mão de sua essência.
E sentia asco também.
À idéia de ser mulherzinha. À remota possibilidade de se esvaziar por dentro, de tropeçar nas futilidades, de mergulhar na alienação, de ser escrava das tendências, refém da irrelevância, reduzida a extravagância de seus enfeites...
No entanto, a menina era ciente de sua força – forte e natural como a maternidade.
Por isso acreditava.
Sonhava em ser mulher quando crescesse...
Foi o melhor viva da menina às mulheres.
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