A menina caminhava pela vida, tristonha, cansada e sem rumo, quando viu aquela Senhora vindo em sua direção. Por um instante chegou a crer que estava nua, mas logo viu que não. Em seguida a percebeu rodeada de animais, contemplando cada um com uma tranqüilidade descomunal. E a cada passo dado, algumas pessoas também se achegavam a ela, com os mais variados semblantes, e absurdamente se desmanchavam em sorrisos – não os de quem acha engraçada a situação, mas sorrisos confortantes que depositavam alegria e confiança, sorrisos que brotavam do mais íntimo de suas almas.
Se viu imóvel e sem pensamento algum, incapacitada de compreender se tal cena era realidade ou mera ilusão, sem reação, à espera daquela que vinha ao seu encontro. Teriam o cansaço e desânimo levado a menina à loucura? Não. Era ali um encontro inusitado, no último dia do ano, a marcar toda a sua vida...
Tinha o semblante mais feminino que já se viu, conjugado a um ar maternal iluminado. Ao passo que transbordava juventude, transbordava também a experiência de longos anos. Suas vestes pareciam não lhe servir de disfarce e a beleza de sua alma refletia através das roupas, fato que a fazia parecer nua. E aquela esplêndida beleza assim o era por ser também acidentada. Não fazia questão de disfarçar as marcas de dor, pelo contrário, as mantinha nítidas e visíveis, elas que a complementavam, transformando-na em beleza singela... Sim. Pois era simplesmente bela! Sim. Era simplesmente bela!
A menina pensa nuca ter visto tanta beleza numa única mulher. Francamente não sabe como seus olhos conseguiram registrar tal imagem e suportar a luz que emanava dela. Crê que se conseguisse lembrar e transcrever em palavras aquele momento, jamais ficaria doente ou envelheceria... Mas se esqueceu. Lembra vagamente da beleza insuportável de seu rosto e da satisfação que senti ao perceber traços de semelhança entre elas...
Enquanto caminhava, a senhora transformava cada um dos que encontrava. Os jovens buscavam nela um amor maternal diferente, ali se tornavam seus próprios filhos, e no entanto, eram convidados a retornarem ao seus pais naturais, amando-os ainda mais. Os homens, ao olharem para ela, se transformavam em seus amantes, mas o amor que ela oferecia os tornavam mais fiéis às suas esposas e filhos e não menos. As mulheres que a contemplavam desejavam suas virtudes e alcançavam a possibilidade de tê-las para si, uma a uma; aspiravam à sua beleza e se tornavam capazes de assumi-la e de se identificarem cada vez mais com ela. Tinham-na como mais perfeito modelo. Todo animal e ave que a ela se achegava também encontrava espaço em seu amor.
É... Não dá para descrever a plenitude do amor daquela mulher: a vida que transbordava dela chegava a todos, como a pedra atirada ao lago que espalha mais e mais ondas concêntricas...
Olhou em nos olhos da menina, trazendo plenitude infinita. Seu calor desfez afetos e sentimentos, fez brotar o mais belo sorriso da alma. Sentiu-se protegida, amada, capaz, inspirada a ser como aquela Senhora...
O encontro não foi só isso, foi embalado ao som do Te Deum... Não há como descrever.
Sinto que ela se fará presente na vida da menina por todo o ano...
A menina só sabe que escondia Alguém maior.
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